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O Cuidador Familiar
O Cuidador Familiar

Cuidador familiar: um personagem muitas vezes esquecido.

 

                                                                          Enf. Jorge Franco

 

Resumo

 

Este artigo procedente de uma revisão bibliográfica evidencia o cuidador familiar como o principal responsável pelo cuidado ao nível domiciliário. Traça o seu perfil e aborda os principais motivos que normalmente fazem com que uma pessoa assuma tal papel. Descreve sentimentos e necessidades experimentados consoante os estudos realizados. Finalmente faz uma análise do sistema formal de saúde e conclui com algumas recomendações.

Palavras-chave: Cuidador familiar; invisibilidade; descrição.

 

 

Introdução

Uma das principais características deste início de século é o envelhecimento da população, fruto de um aumento significativo da esperança de vida. Esse facto torna-se relevante na medida que causa um aumento da demanda social e económica devida esta população necessitar de uma maior atenção por parte não só das autoridades de saúde, como também de suas famílias.

 A ONU estima para os próximos 20 anos, um aumento de 300% nas necessidades em cuidados de saúde da população idosa. Paralelamente a isso espera-se um aumento acentuado da prevalência de doenças não transmissíveis e de evolução prolongada que deverão reclamar por políticas de saúde que prestigiem mais apoios à assistência domiciliária.

Actualmente, devido a sobrecarga do sistema de saúde, observa-se uma tendência para se diminuir ao máximo possível o tempo de permanência dos indivíduos nas unidades de saúde e para transferir muitos cuidados, que dantes eram tidos como hospitalares, para os serviços de apoio a comunidade e com isso para as famílias. COLLIÉRÈ (1999), refere que a família é o eixo dos cuidados “ (…) que detém em si próprio um valor terapêutico”. Por ser uma unidade viva, é nesta que se encontra o maior número de cuidadores informais, destacando-se as mulheres, pois desenvolvem este ofício desde o início da humanidade.

A insistência por um modelo biomédico centrado na doença, deixa de lado aquele que mais assiste ao doente “o cuidador”, pois não permite que o seu trabalho tenha a visibilidade merecida e todo o apoio necessário. Cabe a Enfermagem, à responsabilidade pelo aprimoramento e desenvolvimento de acções que sejam verdadeiramente centradas na família, tendo em conta o seu contexto.

Tendo o cuidador familiar como o principal responsável pela assistência ao nível domiciliário, este trabalho traça o seu perfil, descreve sentimentos, dificuldades, necessidades e recomenda algumas acções que devem ser realizadas pelo sistema formal de saúde.

 

Perfil e os motivos que levam a ser um cuidador

Os cuidadores familiares desempenham um papel crucial, pois assumem a responsabilidade em cuidar do familiar. A maioria são do sexo feminino, normalmente esposas, filhas ou filhos que desempenham o papel preponderante no resgate do cuidar. Apresentam geralmente nível educacional baixo e se situam em faixas etárias próximas das pessoas que cuidam, o que explica o facto de grande parte desses cuidadores ser os cônjuges.

Quando fala-se de cuidador familiar, faz-se referência a uma pessoa adulta, que realiza e proporciona as actividades de vida diária, procurando minorar ou até mesmo suprir o deficit de auto cuidado da pessoa que cuida.

Os motivos que levam com que o familiar seja o cuidador principal são na generalidade: a disponibilidade de tempo para o fazer, o sentimento de obrigação e de dever e a solidariedade. CALDAS (1995), coloca que os factores que influenciam o familiar a assumir a responsabilidade do cuidar são: a influência histórica, os imperativos culturais e os preceitos religiosos.

É comum verificar que muitas pessoas aceitam, de forma súbita e inesperada, o papel de cuidador sem que para isso tenham se preparado adequadamente ou pensado seriamente no assunto. Estas pessoas, em um acto impulsivo, assumem ou sem perceber vão arcando com pequenos cuidados e quando se dão conta já estão completamente envolvidas e comprometidas com a situação. FERNANDES (2002), relata que na maioria das vezes a pessoa assume um papel que lhe é imposto pelas circunstâncias e não por escolha própria, apesar de reconhecer que esta missão naturalmente seja sua.

 

Sentimentos / Dificuldades

O planeamento de alta é extremamente importante e deve ser aplicado a todos os cuidadores. Porém, infelizmente observa-se situações em que este instrumento é mal aplicado ou simplesmente inexiste, o que gera dificuldades e sentimentos de incerteza. CONNEL e BAKER (2004), colocam que muitos cuidadores acabam por experimentar um elevado grau de incerteza quanto ao próprio planeamento dos cuidados e que por isso, utilizam algumas estratégias de coping na tentativa de ultrapassar os obstáculos. No que refere as estratégias citam: 1) manutenção de uma atitude positiva; 2) adaptação à mudança; 3) comparação com os outros; 4) mudanças no trabalho; 5) o humor; 6) o suporte de familiares e amigos próximos. Já RODRIGUES; et al., (1999), em um estudo com cuidadores familiares de idosos com sequelas de AVC, identificou uma diversidade de sentimentos experimentados pelos cuidadores no decorrer do processo de cuidar como o carinho, amor, indignação pela situação, o prazer, a pena, a tristeza entre outros.  

O cuidador familiar tende a valorizar em primeiro lugar as necessidades da pessoa que cuida, deixando para um segundo plano as suas próprias necessidades. Muitas vezes, após assumir a responsabilidade do cuidar, experimentam dificuldades/necessidades como: a pouca ou nenhuma informação a cerca da doença, dúvidas quanto a prestação de cuidados, falta de recursos e de apoio económico além das relacionadas ao suporte emocional.

O planeamento de alta permite ao familiar obter informações importantes durante o processo de hospitalização, facilitando a planificação do regresso a casa e o processo de transição. Porém, o enfermeiro deve ter atenção alguns pontos como DRISCOLL, A (2000), coloca bem: 1º) a percepção da informação por parte do cuidador; 2º) a suficiência dessa informação; 3º) a devida utilização dessa informação. Quanto ao primeiro ponto é importante a realização de um planeamento adequado a cada situação específica e de acordo com as necessidades sentidas. No que diz respeito ao segundo, é imprescindível que os cuidadores recebam informação suficiente para que se diminua a ansiedade e a probabilidade de complicações domiciliares. E finalmente quanto a utilização da informação, que esta gere cuidados domiciliares mais eficazes e que contribua para redução do número de readmissões e do tempo de permanência dos doentes ao nível hospitalar. 

Um outro ponto a ter em conta é a sobrecarga que o cuidador vive devido aos factores geradores de stress e ansiedade. Esta sobrecarga pode estar ligada a uma dimensão objectiva como é o caso dos acontecimentos e actividades concretas como a dependência económica, mudança na sua rotina, a falta de tempo para si mesmo, entre outros ou a uma dimensão subjectiva que inclui os sentimentos de culpa, de vergonha, baixa auto-estima e a preocupação excessiva com o familiar doente.

O cuidador que se dedica ao cuidar de uma pessoa totalmente dependente sem qualquer tipo de apoio formal, tende a vir a sofrer desgastes físicos e emocionais consideráveis, provenientes da sobrecarga imposta principalmente quando o doente assistido apresenta além de incapacidade física algum deficit cognitivo. MAROTE; et al (2005), dá exemplos de alguns sinais de desgaste físico referenciados pelos cuidadores: lombalgias, cansaço físico, hipertensão arterial, anorexia, cefaleias, entre outras. Refere também a ocorrência de alterações no sistema imunológico para além de problemas como fadiga crónica, alterações cardiovasculares, depressão e ansiedade em níveis superiores aos da população em geral.

 

Sistema Formal / Informal

A procura por parte do cuidador as unidades de saúde ocorre, em muitos casos, em momentos de extremo sofrimento. Os técnicos de saúde devem estar atentos e procurar investigar a possibilidade da relação entre os motivos desta procura e o possível desgaste físico e mental proveniente do processo de cuidar. Contudo, na maioria das vezes, o modelo biomédico aplicado impede que seja detectado a verdadeira razão dessa procura e o seu real estado de saúde, pois se limita simplesmente ao tratamento sintomático do problema.

A ineficácia dos programas públicos de saúde de atenção ao domicílio não só trás graves prejuízos a todo o sistema como também a grande massa de cuidadores.MONIS; et al., (2005), relata que o cuidado formal de saúde prestado no domicílio “não é mais de que a ponta do iceberg no qual o sistema informal constitui um verdadeiro sistema invisível de cuidados de saúde.” 

O enfermeiro deve observar a família como uma unidade, um grupo e não como uma simples soma de pessoas. Deve entender que qualquer alteração em um de seus membros pode repercutir no funcionamento do grupo como um todo. Durante a visita domiciliar deverá estar atento não só ao doente como também ao seu cuidador, ambos inseridos em um contexto próprio e envolvido em relações sociais e afectivas. CRESPO e LOPEZ (2007), ressaltam que é importante que os profissionais, inclusive o enfermeiro, desenvolvam e incentivem vários tipos de intervenções com a finalidade de salvaguardar a integridade física e emocional dos cuidadores e citam: 1º) apoios formais mediante serviços comunitários de alívio; 2º) programas psicoeducativos; 3º) formação de grupos de ajuda mútua; 4º) intervenções psicoterapeutas; 5º) combinações das anteriores. Já PERA (2000), sugere outras medidas que também devem ser incentivadas: 1ª) proporcionar formação adequada dos cuidadores objectivando a melhoria dos cuidados prestados, prevenção de lesões e redução do stress; 2ª) fornecer informação sobre técnicas de planeamento com a finalidade de gerir melhor o tempo: 3ª) identificação, diagnóstico e tratamento imediatos de problemas por parte dos profissionais; 4ª) proporcionar opções de escolha (sistemas de apoio) para que em momentos de dificuldade o cuidador possa recorrer e buscar a ajuda necessária e sem demora.

É importante adequar a aplicação de qualquer programa as necessidades das pessoas. Uma das estratégias é a de envolver as famílias nos cuidados prestados ao nível hospitalar, numa tentativa de capacita-las para a futura transferência do doente para o domicílio, facto já observado em muitas unidades de saúde. Porém, não deixa de ser imprescindível mais investimentos em políticas de intervenção comunitária onde os profissionais possam desenvolver planos de saúde de interesse das famílias, onde o conjunto de acções não foquem somente a pessoa dependente mais também o seu cuidador.

 

Conclusão

O cuidador familiar representa a base do cuidar no domicílio, pois apesar da pouca visibilidade é ele que assegura a grande parte da assistência a esse nível. Estudos mostram que a grande maioria tem nível educacional baixo, são do sexo feminino e não recebem qualquer tipo de remuneração pelo que fazem. Os motivos que levam as pessoas a serem cuidadores familiares são o sentimento de obrigação e solidariedade, os factores históricos e culturais e o simples facto de não existir uma outra opção.

Existe uma tendência cada vez maior para se transferir o cuidar para o domicílio responsabilizando assim as famílias. Verifica-se que, em muitas ocasiões, essa transferência não é acompanhada com a devida avaliação quanto as condições dos familiares para que o recebimento do doente dependente seja feito sem qualquer tipo de risco. Alguns estudos destacam a importância das unidades hospitalares e outras à nível comunitário se organizarem no sentido de planear melhor a transferência do doente para o domicílio e para o desenvolvimento de programas de formação para cuidadores em diversas áreas.

Dentre as estratégias sugeridas verificou-se: a criação de um serviço comunitário de alívio, onde o cuidador possa fazer pausas de descanso sempre que necessitar; o fornecimento de formação e informação suficiente aos familiares, maior investimento em políticas de intervenção comunitária que garantam a integridade física e psicológica dos cuidadores.

 

Referenciais Bibliográficas

 

1 - MAROTE, A; CARMEM, M; LEODORO, S; PESTANA, V; - Realidade dos Cuidadores Informais de Idosos Dependentes da Região Autónoma da Madeira. Revista de Investigação Sinais Vitais, nº 61,  Julho, Coimbra (2005) p.19-24  ISSN 0872-0844.

2 - CONNEL, B e BAKER, L - Managing as carers of stroke survivors: strategies from the field. Journal of Nursing Practice. Oxford. 10, (2004) p. 121-126.

3 - CRESPO, M ; LÓPEZ, J - Intervenciones  con cuidadores de familiares mayores dependientes: una revisión. Psicothema, vol 19 (2007).  AN 24805796, disponível: https://web.ebscohost.com/ehost/results

4 - RODRIGUES, P; APARECIDA, R; ANDRADE, O.G - Representaciones del cuidador familiar : Ante el anciano com ACV. Revista de Enfermaria, vol 22 nº6 (1999). ISSN : 0210-5020.

5 - CALDAS, C.P - Contribuindo para a construção da rede de cuidados: trabalhando com a família do idoso portador de sindrome demencial. Revista de Enfermagem. UERJ, Rio de Janeiro, Vol 3, nº 2 (1995) disponível: https://www.unati.uerj.br/tse/scielo.php?script.    

6 - O.M.S- Declaração elaborada pelo Grupo de Trabalho da Qualidade de Vida  Organização Mundial de Saúde. Disponível:

URL: https:// www.ops.org.br/publicacl.

7 - PERA, I.P - El cuidador Familiar. Una Revisión sobre la necesidad del cuidado doméstico y sus repercusiones en la familia. Revista de Enfermaria y Humanidades. Ed. Consejo de Enfermeria de la Comunidad Valenciana. (2000).

Dep.Legal: A-3.210-2000.

8 - MONIS, C; LOPES, G; CARVALHAS, J; MACHADO, S - Sobrecarga do Cuidador Informal. Revista de Formação continuada de Enfermagem - Informar. Ano XI, nº 35, (2005)  Dep. legal nº 86 748/95.

9 - COLLIÉRÈ, Marie-Françoise - Promover a vida: da prática das mulheres de virtude aos cuidados de enfermagem. 2º edição Lisboa, Edições Técnicas (1999).

10- MARTINS, M.M.F.P.S - Uma crise Acidental na Família. O Doente com AVC. Coimbra, edição Formasau (2002). ISBN 972-8485-30-1.

11- DRISCOLL. A - Managing post-discharge care at home: na analysis of patients’ and  their carers’ perceptions of information receiced during their stay in hospital. Journal of Advanced Nursing. (2000). Disponível: https://web.ebscohost.com/ehost/detail?vid

12- MARTINS, M.M.S; - A Família, um Suporte ao Cuidar. Revista sinais Vitais. 50, p.52 a 56. Coimbra (2003) ISSN 08728844.